CARAVANA VLT: A REALIDADE AO LONGO DOS TRILHOS

Imagem 1 _ Caravana VLT. Fonte: Lívia Costa

Em decorrência dos impactos da obra do Veículo Leve sobre Trilhos (VLT) Parangaba Mucuripe, representantes do Escritório de Direitos Humanos Frei Tito de Alencar (EFTA), do escritório de Direitos Humanos Dom Aloísio Lorscheider, da Defensoria Pública do Estado, do Laboratório de Estudos da Habitação – UFC e da Frente de Luta por Moradia Digna participaram, nos dias 28 e 29 de junho, da Caravana das Comunidades Atingidas pelo VLT, com o objetivo de apreender dos moradores as violações de direitos sofridas durante a obra. 

Mapa com as comunidades atingidas pelas obras do Veículo Leve sobre Trilhos (VLT), em destaque as que foram previstas na “Caravana do VLT”. Fonte: PLHIS, 2012; LEHAB.

No primeiro dia de caravana, foram visitadas 4 comunidades (Mucuripe, Jangadeiros, Rio Pardo e Trilha do Senhor). As demandas mais urgentes eram relacionadas à mobilidade dos moradores, que precisavam atravessar os trilhos para se deslocar até a Avenida Abolição. Dona Graça do Mucuripe apontou possibilidades de melhor localização da passarela, visto que o local previsto pela obra prevê grandes deslocamentos. Na comunidade Jangadeiros, um terreno destinado a uma praça, que segue sem ser construída, é espaço para entulhos enquanto a obra evolui nas proximidades. As casas remanescentes encontram-se cercadas, para além dos entulhos, por materiais para a construção das estações. Durante o percurso, encontramos escombros das casas demolidas e muitas reclamações sobre o acúmulo de lixo e os problemas relacionados, como mau cheiro, insetos e ratos.  

Para além disso, há a incerteza dos moradores em relação a alterações no projeto. Dona Maria Rodrigues mora isolada entre duas casas demolidas e destaca a dificuldade de permanecer. Alguns moradores denunciaram a preocupação com os valores da indenização, que estão em atraso e precisam de correção monetária. Questionaram também se vão conseguir construir novas casas após a finalização da obra, no caso das desapropriações parciais, devido ao receio dos terrenos serem ocupados durante o processo, além dos custos da reconstrução serem superiores ao valor da indenização (cerca de 22 mil reais por moradia), e ainda, surgem dúvidas sobre qual seria o período permitido para a reconstrução das casas após sua demolição. Dona Terezinha do Rio Pardo comenta a falta de lazer para crianças e jovens que, durante a visita, brincavam no trilho, visto que a única quadra da região, localizada em uma escola pública, estava interditada com riscos de desabamento. Algumas pessoas que moram há anos de aluguel nas comunidades atingidas não tem informações sobre seu direito à moradia, além de não terem perspectivas para onde ir, no caso do proprietário do imóvel aceitar a desapropriação. 

Imagem 2 _ Maria Rodrigues, moradora do Rio Pardo, ao lado de casa demolida. Fonte: Lívia Costa

No segundo dia de caravana, foram visitadas mais cinco comunidades. Iniciando com a João XXIII, localizada no bairro Aldeota, é perceptível a transformação da rotina das comunidades com as obras. Por exemplo, próximo a comunidade, há uma estação do VLT e, em virtude disso, o governo aderiu a duas medidas com relação à infraestrutura urbana: a construção de um muro separando a comunidade do trilho e a construção de uma passarela. Entretanto, para os moradores, as medidas não oferecem melhorias à comunidade, visto que a passarela é muito distante e facilita apenas o acesso de um empreendimento comercial em construção à Avenida Pontes Vieira, importante via da cidade, nas proximidades da Assembléia Legislativa. Além disso, em frente à comunidade, há uma escola na qual as crianças costumam brincar, e, devido à distância da passarela, tem-se a dificuldade de acesso ao único espaço de lazer no entorno. Ademais, as obras ocasionam múltiplos transtornos aos moradores, desde a convivência com poeira e entulhos até a falta de saneamento básico.  

Seguindo até o PIO XII, os problemas com o lixo e os entulhos se repetem. Segundo a moradora Maria da Penha, a população pouco foi informada acerca do que vai se seguir com a obra, visto que não se sabe, por exemplo, se haverá passagem de nível ou passarelas e onde será construído o muro de separação do trilho. 

Em contrapartida, no Lagamar, no bairro São João do Tauape, a obra já está em fase de finalização. Apesar disso, os habitantes das proximidades do trilho ainda estão sem iluminação pública (nem mesmo uma provisória foi instalada) e convivem com os entulhos da obra e o lixo produzido na região a céu aberto, visto que desde 2010 os containers de lixo foram retirados da comunidade. Por representar uma Zona Especial de Interesse Social (ZEIS), a moradora Adriana Geronimo relata que a participação dos moradores nas intervenções foi solicitada ao governo desde o início das obras, resultando, por exemplo, na construção de três passagens de nível, que, ao início da obra, estava prevista apenas uma. Além disso, está sendo construída na região um EcoPonto e uma praça, e segundo Adriana eles já contactaram os órgãos responsáveis para saber do desenvolvimento do projeto, a fim de participar coletivamente dessas intervenções relatando as reais necessidades da comunidade. 

Na comunidade Aldaci Barbosa, localizada no bairro de Fátima, as principais reclamações são relacionadas às rachaduras nas residências e aos entulhos das casas demolidas que estão entre as travessas há cerca de cinco meses. Com o trilho dividindo a comunidade ao meio, o único acesso se dá através da própria estação do VLT, por uma calçada estreita ao longo de uma via bastante movimentada, por isso os moradores solicitam a construção de uma passarela na Avenida Borges Melo, facilitando o acesso ao outro lado, principalmente dos idosos da região. 

Por fim, visitou-se a comunidade Caminho das Flores, no bairro Parangaba. Na região, o trilho é elevado, e, ao fim da obra, os moradores solicitam a urbanização da área, visto que nem mesmo a via de acesso foi construída, sendo a circulação impossibilitada pelos postes de iluminação provisórios que foram colocados. Ademais, o morador Thiago de Souza acrescenta a questão dos esgotos a céu aberto, já que, antes das desapropriações, a prefeitura desfez o Projeto Sanear, o qual não foi restabelecido, revelando a situação de abandono da comunidade. 

Constata-se, com as visitas, que as comunidades continuam sofrendo com os infortúnios da realização da obra do VLT, principalmente pelo convívio com lixo, entulho e esgoto a céu aberto. Além disso, a ausência de diálogo com as comunidades reforça as incertezas dos moradores quanto aos impactos da obra, que ainda não está concluída. Desse modo, espera-se a finalização do relatório que está sendo realizado pelo Núcleo de Habitação e Moradia (Nuham) da Defensoria Pública do Estado do Ceará em parceria com o Escritório de Direitos Humanos Frei Tito, a fim de que seja realizada uma audiência pública para reivindicar os direitos dos moradores. 

 

Registro de visita por Simone Oliveira, Lívia Costa e Janaina de Brito, como parte da pesquisa Regimes Urbanos-INCT e Projeto Observatório de Remoções de Fortaleza

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